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quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Gracias a la vida' - FERREIRA FERNANDES

"A frase impossível - o Natal é quando o homem quer - calhou ontem, 13 de Outubro. O cântico foi da velha chilena Violeta Parra: Gracias a la vida. Os presentes vinham num embrulho que ia e vinha e trazia sempre as letras certas: Fénix. E esses presentes eram tão raros que outrora o poeta Brecht os deu como desaparecidos. Quem construiu a Tebas a das sete portas? Para onde foram os pedreiros na noite em que ficou pronta a Muralha da China? A grande Roma está cheia de arcos de triunfo - quem os levantou? Perguntas antigas, que ontem tiveram resposta, tiveram nomes. Florencio Ávalos, Carlos Mamani, Jimmy Sánchez, Victor Zamora, Esteban Rojas... E de cada vez que um presente era aberto e um nome aparecia, as sirenas soavam e olhos alagavam-se. O poeta perguntara também: "Filipe de Espanha chorou, quando a Armada/ Se afundou. Não chorou mais ninguém?" Ontem, chorávamos todos, o filho do Florencio, a loira da Sky News, o solitário no café da Madragoa. Ontem, um dos danados da terra e desapossados de nome, mal ganhou nome, Mario Sepúlveda, o segundo da dinastia dos 33, falou por ele e por todos - cumprindo as palavras de Violeta Parra: "El canto de todos que es mi proprio canto." Pousou o bornal e tirou dele pedaços de rocha que arrancou à mina, que distribuiu. E depois disse isso em palavras: "Não me tratem como artista, sou Mario, o trabalhador mineiro."

Diário Notícias,  Link

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

"A soldado desconhecida" por FERREIRA FERNANDES


"Josefa, 21 anos, a viver com a mãe. Estudante de Engenharia Biomédica, trabalhadora de supermercado em part-time e bombeira voluntária. Acumulava trabalhos e não cargos - e essa pode ser uma primeira explicação para a não conhecermos. Afinal, um jovem daqueles que frequentamos nas revistas de consultório, arranja forma de chamar os holofotes. Se é futebolista, pinta o cabelo de cores impossíveis; se é cantora, mostra o futebolista com quem namora; e se quer ser mesmo importante, é mandatário de juventude. Não entra é na cabeça de uma jovem dispersar-se em ninharias acumuladas: um curso no Porto, caixeirinha em Santa Maria da Feira e bombeira de Verão. Daí não a conhecermos, à Josefa. Chegava-lhe, talvez, que um colega mais experiente dissesse dela: "Ela era das poucas pessoas com que um gajo sabia que podia contar nas piores alturas." Enfim, 15 minutos de fama só se ocorresse um azar... Aconteceu: anteontem, Josefa morreu em Monte Mêda, Gondomar, cercada das chamas dos outros que foi apagar de graça. A morte de uma jovem é sempre uma coisa tão enorme para os seus que, evidentemente, nem trato aqui. Interessa-me, na Josefa, relevar o que ela nos disse: que há miúdos de 21 anos que são estudantes e trabalhadores e bombeiros, sem nós sabermos. Como é possível, nos dias comuns e não de tragédia, não ouvirmos falar das Josefas que são o sal da nossa terra?"