"Haverá melhor imagem que a do 2.º Juízo Criminal do Tribunal de Vila Franca de Xira para ilustrar o estado em que o País se encontra? Mais importante que o caseiro acordo para a viabilização do Orçamento entre o Governo e o PSD - em casa do professor Catroga não deveria chover - é a notícia de que vários processos ficaram parcialmente destruídos e a maquinaria sem funcionar por causa da água que entrou no contentor que serve de sala do dito tribunal desde o Verão. É tempo e material que se perdem. É dinheiro e trabalho que foram gastos inutilmente.
Este tipo de situações deveria fazer-nos pensar. São retratos de um Portugal que se deixa afundar pela inércia e pela ausência de uma cultura de responsabilização do Estado a quem pagamos e que nos falha naquilo que nos é devido. Se há ocasiões em que vale a pena ser pessimista, esta é uma delas. Só os que não querem ver a realidade é que podem atrever-se a dizer que está tudo bem, que existem muitas oportunidades, muitos casos de sucesso e que é possível, assim como num passe de magia, transformar este quotidiano sorumbático e deprimido num mar de rosas.
Vamos ter um Orçamento do Estado penoso, todos já o sabemos, e até ouvimos o Presidente explicar, na sexta-feira à noite, que a actual situação financeira é muito grave e não se compadece com atitudes que levem a uma crise política.
Já o sabemos. Sabemo-lo há demasiado tempo. Nós e os outros que olham para nós desde fora e que têm os números na mão. A realidade é que o FMI, a OCDE e a Comissão já perceberam que a crise portuguesa não é um problema resultante da crise internacional. É um problema de má governação, de baixo crescimento, de desemprego, de descontrolo das contas públicas e de perda de competitividade. Há dez anos que andamos a marcar passo, que estamos a ser ultrapassados pelos nossos parceiros na União Europeia e até pelos mais pobres - excepto o Haiti - a nível mundial. No relatório das Perspectivas Mundiais que o FMI apresentou há uns dias em Washington está lá tudo: Portugal é a segunda economia do mundo que menos cresceu na última década (6,47%); o nosso PIB é de 223,7 mil milhões de dólares, estamos em 38.º lugar, mas descemos três degraus em dez anos; o nível de riqueza por habitante é de 23 114 dólares, descemos do 34.º lugar para o 41.º, e nenhum país da UE registou uma queda tão abrupta no poder de compra como nós. E, para que possamos ainda ser mais pessimistas, a perspectiva é que, nos próximos cinco anos, Portugal (4,1%), Grécia (5,4%) e a Venezuela (5,8%) serão os países do mundo que menos crescerão.
Significa isto que, depois de uma década perdida, vamos continuar a meter água. Há que arregaçar as mangas e as calças! "
Diário Notícias, Link
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